Separadas no berço: brasileiros buscam nossa origem em estrela gêmea do Sol

Thiago Signorini Gonçalves

Thiago Signorini Gonçalves é doutor em astrofísica pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia, professor do Observatório do Valongo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e coordenador de comunicação da Sociedade Astronômica Brasileira. Utilizando os maiores telescópios da Terra e do espaço, estuda a formação e evolução de galáxias, desde o Big Bang até os dias atuais. Apaixonado por ciência, tenta levar os encantos do Universo ao público como divulgador científico.

04/02/2021 04h00

De onde viemos? Não é essa a pergunta que todos nos fazemos? Na astronomia, essa é uma questão particularmente importante, já que buscamos entender a origem do Sol e dos planetas. Afinal, como chegamos aqui?

Agora, o trabalho de uma equipe brasileira de astrônomos liderada por Jhon Yana Galarza e Jorge Meléndez, da Universidade de São Paulo, pode nos ajudar a compreender essa história um pouco melhor. Pela primeira vez, podemos analisar em detalhes a composição química de uma estrela muito parecida ao Sol, para comparar as histórias de formação e tentar entender diferenças e similaridades entre as duas.

A conclusão? Para entendermos o Sol, não basta verificarmos suas propriedades básicas, mas também precisamos saber o que aconteceu com o seu berçário estelar mesmo antes que ele nascesse.

Para chegar a esse resultado, a equipe escolheu a estrela HIP 11915, uma “gêmea solar” a 176 anos-luz de distância, na constelação da Baleia. Ela recebe a denominação de “gêmea” por possuir características quase idênticas ao Sol, como massa, temperatura, idade e composição química. Como gêmeos criados em lares diferentes, as diferenças entre HIP 11915 podem então ser traçadas às suas origens, e não a características “genéticas”.

Yana Galarza e sua equipe então utilizaram a câmera ESPRESSO, instalada em um dos telescópios de 8 metros do Observatório Europeu do Sul, no Chile. Com esse poderoso instrumento, podiam então estudar a composição química da estrela em mais detalhes, medindo a concentração de elementos como o sódio, alumínio, cálcio e manganês com precisão de até 0,5%.

Os cientistas conseguiram então, pela primeira vez, medir o efeito “par-ímpar” em uma estrela semelhante ao Sol. Esse efeito, conhecido há cerca de 100 anos, mostra que átomos com um número par de prótons são mais abundantes que átomos com números ímpares. Embora possa parecer algo estranho, é um resultado direto das fases finais de estrelas que explodem supernovas.

Com medições tão precisas, os astrônomos puderam então concluir que esse efeito é mais pronunciado em HIP 11915 que no Sol. A melhor explicação seria então uma supernova que explodiu antes do nascimento dessa estrela e “poluiu” os seus arredores de uma forma diferenciada.

O trabalho tem implicações importantes para entendermos nossas origens. Afinal, os elementos fundamentais para a nossa existência foram formados antes que o Sistema Solar fosse criado, e aparentemente essa mistura química depende de pequenos detalhes da história prévia do nosso lugar na galáxia.

O estudo conclui com a conjectura de que as condições em HIP 11915 seriam suficientemente semelhantes ao Sol para que os planetas ao seu redor tenham se formado de maneira parecida. Mas será que essas pequenas diferenças poderiam ter algum impacto nas características desse sistema planetário? Yana Galarza resume a importância da descoberta: “HIP 11915 também possui um planeta com as mesmas características que Júpiter – e quem sabe também um planeta parecido à Terra com algum tipo de vida extraterrestre”

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Fonte: https://www.uol.com.br/tilt/colunas/thiago-goncalves/2021/02/04/astronomos-no-brasil-desvendam-segredos-sobre-a-origem-do-sol.htm