Pessoas negras e tecnologia: um caso antigo e constante de apagamento

Akin Abaz

Akin Bakari D’Angelo dos Santos é fundador da InfoPreta e homem trans. Um curioso nato e um amante do desconhecido, sempre se interessou por montar, desmontar e entender o funcionamento dos eletrônicos. Fez cursos técnicos na adolescência e, aos 15 anos, já atuava na área da indústria com manutenção eletrônica de maquinário pesado. Em 2011, começou a consertar computadores em seu quarto e dois anos depois fundou a InfoPreta, empresa de serviços de manutenção que tem por objetivo inserir pessoas negras, LGBTQI+ e mulheres no mercado tech, aliando lucros a projetos sociais de grande impacto.

Colunista do UOL*

13/05/2021 04h00

O que me move e o que move a InfoPreta é tornar a tecnologia um espaço para todes, seja para quem trabalha ou deseja trabalhar na área, seja para os usuários.

Assim como vários outros espaços, a tecnologia é majoritariamente ocupada por homens brancos com um poder aquisitivo maior do que grande parte da população. Na verdade, não só ela, o mercado de trabalho em geral ainda é excludente com qualquer minoria: mulheres, pessoas negras, pessoas LGBTQIAP+, pessoas com deficiência, entre outros grupos.

Ao longo dos anos, as áreas ligadas à ciência, às exatas e à tecnologia foram vistas como exclusivas aos homens, sobrando para as mulheres o trabalho doméstico ou profissões como o magistério e a enfermagem, por exemplo.

Mas nem sempre foi assim. Você sabia que as primeiras programadoras foram as mulheres? Na época em que os computadores funcionavam através da influência humana, eram as “garotas do Eniac” que ficavam responsáveis por dar as instruções necessárias para que o supercomputador realizasse seus cálculos.

Da mesma forma, muitas vezes costumamos pensar no espaço que as pessoas pretas devem ocupar hoje e no futuro na tecnologia, sem levar em consideração que diversas inovações feitas em todos esses anos podem ter sido pensadas e executadas por elas.

Ao longo dos anos, várias pessoas negras realizaram descobertas e invenções que não se restringem a aparelhos tecnológicos ou supermodernos, e que mudaram também a história da ciência e da saúde, por exemplo. E é normal que a gente nem considere isso, porque somos acostumados a pensar em grandes feitos sempre ligados às brancas, pois esse é o modelo de pessoas de sucesso imposto à sociedade.

Eu adoro jogar videogame, mas até pouco tempo atrás não sabia que foi um homem negro o inventor da função “pausar”. Gerald A. Lawson, engenheiro eletrônico norte-americano, desenvolveu a possibilidade de pausar as partidas sem perder o jogo, o que era inexistente nos primeiros consoles.

A fibra ótica também foi invenção de uma pessoa negra. Sem Thomas Mensah, engenheiro e inventor nascido em Gana, a moderna internet não existiria.

E as inovações não são apenas em relação a tecnologia, aparelhos tecnológicos ou modernos. Os semáforos, o extintor de incêndio, os bancos de sangue, a quimioterapia, os GIFs, entre outros, tudo isso não existiria se não fosse o trabalho de pessoas negras.

A tecnologia passou por um processo comum a vários espaços: o apagamento de mulheres e pessoas pretas. Por isso, muita gente nem imagina que várias invenções ainda presentes no nosso dia a dia foram pensadas por cientistas ou programadores negros.

Hoje ainda é um desafio a presença expressiva de pessoas negras na tecnologia, mas é impossível pensar na conquista desse espaço no presente e no futuro sem resgatar o que já foi feito.

Afinal, se hoje estamos aqui caminhando para conquistar o direito de produzir e utilizar a tecnologia de maneira plena, não podemos esquecer que muitas coisas nem existiriam se não fossem nossos antepassados.

* Colaborou Rhayssa Souza, jornalista e redatora de conteúdo da InfoPreta

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Fonte: https://www.uol.com.br/tilt/colunas/akin-abaz/2021/05/13/pessoas-negras-e-tecnologia-um-caso-antigo-e-constantemente-apagado.htm