Perua do Maverick? Como clássico da Ford ganhou versão que é ‘mosca branca’

Felipe Carvalho

Felipe Carvalho é administrador de empresas, consultor e primeiro “caçador de carros” profissional do país. Seu canal no YouTube dedicado a avaliações de achados automotivos tem mais de 100 mil inscritos. www.youtube.com/CarrosdoPortuga

Colunista do UOL

03/12/2020 04h00

No início dos anos 70, a Ford precisava de um modelo que ficasse entre o pequeno Corcel e o grande Galaxie. Depois de uma pesquisa de mercado com alguns pretendentes, a preferência foi pelo Ford Taunus, um modelo de origem europeia. Porém, a escolha do fabricante acabou sendo pelo Maverick, de origem norte-americana.

Fica difícil dizer se a decisão foi correta, pois podemos apenas especular como teria sido a história do Taunus no Brasil. Fato é que o Maverick não foi um grande sucesso comercial, mas definitivamente conquistou o coração dos brasileiros apaixonados por carros.

Para confirmar isso, basta ver os preços que alguns desses carros estão atingindo no mercado de antigos. Se for equipado com motor V8, o interesse é ainda maior. O mesmo não podemos dizer da belíssima carroceria sedã, com quatro portas e entre eixos 18 cm maior, que por algum motivo não vingou quando novo, tampouco agora, mais de 40 anos depois. Apenas 11% dos Mavericks brasileiros foram fabricados com quatro portas, algo impensável nos dias atuais.

O que poucos sabem é que alguns desses Mavericks sedãs foram transformados em peruas. Numa época com pouca variedade de carros, algumas empresas se especializaram em transformar carrocerias. Uma delas, talvez a mais conhecida, foi a Souza Ramos, que junto com a Sulamericana Carrocerias fizeram essas peruas.

A convite do meu amigo Danilo Motin, um apaixonado por peruas que administra a página “Save The Wagons”, tive o privilégio de conhecer duas, uma cinza e outra champanhe, que ilustram a coluna dessa semana. As peruas pertencem a colecionadores de São Paulo, e certamente chamam atenção por onde passam.

A parte traseira é de aço, com exceção da tampa traseira, que é de plástico reforçado com fibra de vidro. O bocal do combustível, que no Maverick fica na parte central do painel traseiro, foi deslocado para a lateral nessas peruas, liberando espaço para que a tampa traseira fosse até a parte superior do para-choque, algo fundamental numa perua.

O banco traseiro do Maverick sedã foi substituído por outra, da Ford Belina. Com isso, ele passou a ser rebatível, ampliando ainda mais o espaço para bagagens. Essa característica foi utilizada na prática pelo dono da perua champanhe, que precisou levar uma caixa comprida em sua Maverick.

O que me pareceu unânime foi a opinião de que as lanternas não estão no local certo. Por conta do novo corte da tampa traseira, elas foram deslocadas para a área central, mas o ressalto antigo do painel traseiro continuou lá.

O resultado estético não é dos melhores, parece que a traseira está “vesga”. Inclusive os donos estavam conversando sobre isso entre eles. A ideia seria produzir uma lanterna própria para o carro, que tivesse o recorte da tampa no meio dela. Mas, em nome da originalidade, e também pelo altíssimo custo para produzir uma lanterna nova, a ideia foi abortada.

Curioso ver que, naquela época, o acabamento dos carros era o que mais diferenciava uma versão da outra. Ambas peruas, estão equipadas com motor V8, transmissão automática de 3 marchas, ar-condicionado e direção hidráulica. Porém, mesmo iguais nos principais equipamentos, a champanhe é mais “luxuosa” que a cinza, e isso fica evidente quando se observa o acabamento.

Na parte externa, a champanhe ostenta mais cromados e bagageiro no teto. Já na parte interna, os destaques são os acabamentos marrons e os bancos individuais. No mais, são praticamente iguais.

Pouco se sabe sobre a quantidade de peruas que foram feitas com base no sedã. O dono da cinza disse que teve a oportunidade de conversar pessoalmente com Souza Ramos, que passou um número acima dos 200. Porém, considerando o período de produção e a capacidade máxima mensal, esse número jamais poderia ser atingido.

Ao que parece, jamais saberemos quantas de fato foram feitas, tampouco a quantidade de peruas Mavericks que sobreviveram ao tempo. O dono da cinza tem conhecimento de apenas 12 em todo o Brasil. Isso já considerando qualquer tipo de estado de conservação. Inclusive, entre essas 12, ele sabe que algumas estão em estado irrecuperável.

Portanto, certeza mesmo é que essas duas belas peruas são joias raras, que preservam um pouco da nossa rica história automotiva. Será que conseguiremos catalogar mais algumas espalhadas pelo Brasil? Ficarei feliz se algum leitor puder compartilhar o conhecimento de outras sobreviventes.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Fonte: https://www.uol.com.br/carros/colunas/cacador-de-carros/2020/12/03/perua-do-maverick-como-classico-da-ford-ganhou-versao-que-e-mosca-branca.htm