Órbita “diferentona” de planeta dá pistas para entender nosso Sistema Solar

Thiago Signorini Gonçalves

Thiago Signorini Gonçalves é doutor em astrofísica pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia, professor do Observatório do Valongo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e coordenador de comunicação da Sociedade Astronômica Brasileira. Utilizando os maiores telescópios da Terra e do espaço, estuda a formação e evolução de galáxias, desde o Big Bang até os dias atuais. Apaixonado por ciência, tenta levar os encantos do Universo ao público como divulgador científico.

17/12/2020 04h00

Na última semana, Nibiru não está chegando. Não são aliens, mas sim uma descoberta que pode nos ajudar a entender a origem do nosso próprio Sistema Solar.

O objeto HD 106906 — na verdade um sistema binário composto por duas estrelas que orbitam uma à outra— já era estudado há vários anos, e em 2013 astrônomos anunciaram a descoberta do planeta HD 106906b. A grande surpresa, na época, era a distância do planeta, quase mil vezes a distância da Terra ao Sol, sobretudo levando-se em conta a sua massa, 11 vezes maior que a de Júpiter.

O resultado era surpreendente porque sabemos que planetas não se formam tão afastados de sua estrela hospedeira, já que não há material suficiente nessas regiões para formar corpos tão grandes.

Além disso, as estrelas de HD 106906 são bastante jovens, com apenas 15 milhões de anos (lembrem-se, para comparação, que o Sol tem quase 5 bilhões de anos).

Como estrela e planeta se formam juntos, podemos concluir que o planeta deve ter se formado mais próximo das estrelas, e de alguma forma foi parar tão longe muito rapidamente.

Mas como isso pode acontecer? Um outro objeto semelhante poderia ter gerado uma interação gravitacional que lançou o planeta para a periferia do sistema, mas ninguém encontrou nenhum planeta que pudesse ter feito isso.

Agora a equipe liderada por Meiji Nguyen, da Universidade de Berkeley, na Califórnia, pode ter uma outra explicação.

Os pesquisadores compararam as posições do planeta em duas imagens do telescópio espacial Hubble, obtidas em 2004 e 2017, e puderam assim calcular a órbita de HD 106906b ao redor de suas hospedeiras.

Os cientistas viram, então, que a órbita do planeta era especial. Muito alongada, e com uma grande inclinação em relação ao plano de detritos que orbitam as estrelas centrais.

A partir dos dados orbitais, os astrônomos pensaram em um modelo no qual o planeta poderia ter interagido com o par de binárias, gerando uma situação instável que poderia modificar sua órbita significativamente.

Um encontro próximo com uma outra estrela que estava apenas passando na vizinhança num momento oportuno, então, teria estabelecido a órbita final de HD 106906b.

Analisando a órbita de estrelas próximas, os cientistas verificaram que, efetivamente, há pelo menos duas candidatas que poderiam ter passado por ali há alguns milhões de anos.

Embora complexo, esse modelo pode explicar o mistério de como colocar um planeta tão grande tão longe e tão rapidamente. E pode inclusive nos contar como nosso próprio Sistema Solar começou.

Afinal, existem indícios (ainda não comprovados) de um corpo massivo orbitando o Sol a enormes distâncias. Algo que não sabemos como foi parar lá, nem quando.

Por isso, é muito útil poder observar um sistema tão jovem, que nos dá pistas importantes sobre o que pode ter acontecido com o nosso próprio sistema planetário há vários bilhões de anos.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Fonte: https://www.uol.com.br/tilt/colunas/thiago-goncalves/2020/12/17/descobrimos-o-planeta-nove-em-outro-sistema-planetario.htm