Há motivo para deixar no vácuo? Estudo traz as consequências do ghosting

Felipe Germano

Felipe Germano é jornalista que escreve sobre comportamento humano, saúde, tecnologia e cultura pop. Para encontrar as boas histórias, atravessa o planeta: visitou de clubes de swing e banheiros do sexo paulistanos à sets de cinema hollywoodianos. Já trabalhou nas redações da Jovem Pan, do site Elástica, na revista Época e na revista Superinteressante.

15/12/2020 04h00

Estamos perto do Natal, mas no Tinder o clima é sempre de Dia das Bruxas. Culpa do “ghosting”, termo que poderia ser traduzido como algo perto de “dar uma de fantasma”.

Na prática é o bom e velho vácuo, de quem, de repente, para de responder às suas mensagens. Se a atitude é popular o suficiente para ganhar um termo, ela é comum o bastante para motivar um estudo.

Pesquisadores da Universidade de Roterdã (Holanda) publicaram na revista científica Journal of Social and Personal Relationships, uma análise sobre o fenômeno que aparece para a maioria das pessoas que já tentou arranjar amor ou sexo por meio da tecnologia.

Os pesquisadores conversaram com 328 usuários de apps como o Tinder que já tinham sido deixados no vácuo ou deixado alguém sem resposta ou ambos. E algumas conclusões começaram a pipocar.

A primeira conclusão é que ninguém quer assumir o papel de escroto. Quando perguntaram qual foi o motivo de serem deixados falando sozinhos, 59% dos entrevistados botaram a culpa no sumido. Ao mesmo tempo, ao serem questionados sobre por que pararam de responder os coleguinhas, 67% dos ouvidos falaram que não assumiram a bronca: jogaram a bomba no colo dos que ficaram no vácuo.

A culpa no que ficou sem resposta, aliás, é até compreensível. Na hora de justificar uma resposta, parte dos entrevistados afirmaram que pararam de responder por uma questão de segurança quando “os ignorados se recusaram a aceitar suas justificativas para a rejeição e passaram a mostrar um comportamento agressivo, como mandar mensagens repetidamente ou ações persecutórias”, diz o estudo.

A pesquisa ainda mostrou que, frio ou quente, vingança não é um prato muito pedido quando o assunto é ignorar. Não existe nenhum tipo de associação entre frequência de vezes que você foi deixado falando sozinho com um comportamento de começar a ignorar os outros também.

Há quem tome chá de sumiço sem nunca ter tomado um; há quem é sempre deixado no silêncio, mas nunca fez o mesmo com ninguém.

O que dá para cravar, no entanto, é uma relação entre os sumiços e o tempo de uso no app. Quanto mais você usa o Tinder, menor a chance de desaparecer da vida do contatinho.

Há algumas teorias para isso. Uma delas é a lei de oferta e procura. Quem acabou de entrar no aplicativo vê, pela primeira vez, um volume tão grande de pessoas dispostas a transar. Como alguém que entra no mercado com fome, a pessoa pode acabar, no calor do momento, simplesmente partindo para uma gôndola mais interessante.

A outra explicação já leva mais para o lado do trauma. Conforme você está a mais tempo na pista, começa a ficar mais seletivo com quem escolhe. Você nem dá match com o fulaninho, porque depois daqueles três carinhas que têm o mesmo estilo, você já sabe que não vai dar certo. Sem match, sem vácuo.

A pesquisa também se propôs a analisar o impacto do ghosting na vida de quem é deixado no vácuo. As respostas não foram lá tão surpreendentes, mas valem nota.

A autoestima de quem ficou de lado foi afetada. E pessoas com baixa autoestima que começam a ser ignoradas múltiplas vezes registram um grau de incômodo maior com a situação toda.

Ao mesmo tempo, o teto de vidro tem seu valor e, quem deixa os outros no silêncio, tende a se incomodar menos quando toma um troco de outra pessoa.

Aliás, sexo não muda muito na dor em questão. Não tem muita diferença na frustração de quem já havia mandado nudes/transado com o ignorador, e quem ficou só na conversa. A transa nem aliviava e nem piorava as coisas.

“Essas desaparecidas podem até ser sem intenção e acontecerem simplesmente pela forma que as relações se formam nos apps —ainda assim afetam quem se utiliza da indústria de aplicativos de namoro”, concluem os pesquisadores.

É aquela coisa: quem tem Tinder, tem medo.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Fonte: https://www.uol.com.br/tilt/colunas/sexting/2020/12/15/ghosting-qual-a-motivacao-e-consequencia-em-parar-de-responder-no-tinder.htm