Guia tático: fique de olho no que pode decidir Atlético-MG x Flamengo

Rodrigo Coutinho

Rodrigo Coutinho é jornalista e analista de desempenho. Acredita que é possível abordar o futebol de forma aprofundada e com linguagem acessível a todos.

Colunista do UOL

08/11/2020 04h00

Os principais jogos do futebol mundial vêm sendo decididos em cima da capacidade que as equipes têm de pressionar a saída de bola adversária e superar essas mesmas pressões quando são alvos delas. O duelo entre Flamengo e Atlético Mineiro, ainda na 1ª rodada do Brasileirão, teve essa característica. O Galo superou o Rubro-Negro no Maracanã na estreia de Domènec Torrent. Neste domingo certamente veremos um duelo com as mesmas características. Promessa de jogão!

Por mais que tenham um nível de intensidade diferente, Atlético Mineiro e Flamengo possuem muitas similaridades em seus modelos de jogo. São notadamente voltados ao ataque, com problemas distintos em fase defensiva. Utilizam o ”modelo posicional” para criar, têm potentes transições ofensivas, mas lacunas importantes nas transições defensivas.

Abaixo alguns tópicos importantes para ficar de olho na análise das duas equipes e que podem definir o importante duelo:

Ocupação de espaços no campo de ataque.

A forma como Jorge Sampaoli e Domènec Torrent dispõem suas peças no campo de ataque é diferente. Como já citado, ambos executam o ”modelo posicional”, mas há diferenças importantes nas organizações ofensivas de mineiros e carioca.

Na maioria das vezes Sampaoli utiliza três jogadores na primeira linha de passes do Galo. Guga se alinha a Réver e Junior Alonso. No Flamengo, Dome varia entre uma saída com os quatro defensores ou Willian Arão no meio da dupla de zaga, já projetando os laterais mais a frente. Isla dá amplitude pela direita e Everton Ribeiro circula para o centro. Bruno Henrique fica aberto na esquerda, e Filipe Luis encosta para o meio constantemente.

No Atlético, Guilherme Arana ataca basicamente como um meia-esquerda, enquanto Keno e Savarino dão amplitude ao time. Por dentro, há sempre um atleta mais próximo aos zagueiros, Jair ou Allan, e dois meias centrais com funções diferentes. Nathan geralmente encosta mais no centroavante, quase sempre Eduardo Sasha. E o outro meia, que pode ser Alan Franco, Zaracho ou o próprio Jair, caso Allan atue, faz a meia-direita.

A faixa central do rubro-negro desta vez deverá ter Willian Arão mais fixo, Gerson e Thiago Maia circulando na intermediária, um à direita e o outro à esquerda, se aproximando de Pedro, que atua centralizado na referência ofensiva. Ao contrário do Atlético, que dá um pouco mais de liberdade para Sasha sair da área, o artilheiro rubro-negro joga mais plantado entre os zagueiros.

Circulação da bola, movimentação e definição dos lances.

Por mais que tenham percentuais parecidos de acerto nas finalizações, Atlético e Flamengo possuem uma taxa diferente de conversão das chances criadas. Não é segredo para ninguém a dificuldade que a equipe de Sampaoli têm para balançar as redes. O time cria, finaliza na direção da meta muitas vezes, mas não tem a tranquilidade para tirar do goleiro e tomar a melhor decisão seguidamente. Esse é o ponto que mais os diferencia na produção ofensiva.

De resto, fazem a bola circular com velocidade e utilizam muito bem as vantagens do ataque posicional na criação de constantes linhas de passe. Os movimentos de chegada ao fundo de campo também são coordenados, as aproximações para tabelas e triangulações e ataque em massa para definir os lances dentro da área. Flamengo e Atlético em campo é certeza de chances criadas com frequência.

Capacidade de superar ”pressões altas”

Saber sair da marcação adiantada adversária será a chave para vencer o jogo. O Atlético conta como trunfo o passe vertical de Junior Alonso, que mesmo pressionado encontra companheiros mais à frente. Everson também sabe tirar a bola da pressão, e por isso foi contratado pelo Galo. A mobilidade de Guilherme Arana e os demais atletas de meio-campo do time serão primordiais para oferecer essas linhas de passe ainda no momento de saída de bola.

Outra alternativa é o passe longo e em profundidade para Keno e Savarino. Os pontas ficam bem abertos desde o primeiro momento de construção e são constantemente acionados desta forma a partir de passes de Réver, que faz bem esse trabalho.

O Flamengo possui individualidades mais significativas no meio-campo para vencer uma marcação pressão do Atlético. Gerson e Thiago Maia se mexem bastante para gerar as linhas de passe, costumam se desvencilhar bem da marcação ao receberem de costas, giram o corpo e ganham espaço com passadas largas e condução de bola. Everton Ribeiro é um importante auxílio partindo da direita pro meio. Sem contar a qualidade de passe de Filipe Luís neste momento.

Natan e Thuler, possível dupla de zaga titular, precisam se aprimorar neste aspecto. Isla não é exatamente esse jogador. E o jovem goleiro Hugo também oscila jogando com os pés. Assim como com o Galo, uma alternativa bem interessante é o passe longo. Pedro já criou gols assim. Recebe a ligação direta, controla a bola e aciona os companheiros com mais espaço. Bruno Henrique também já balançou as redes recebendo passes diretos em profundidade. Hugo, Filipe Luís e Arão são bons nisso.

Capacidade de pressionar a bola e sistemas defensivos

Mora aqui o grande problema dos rivais. Atlético e Flamengo têm muitos pontos a melhorar sem a bola. O Galo até consegue fazer uma pressão mais forte e bem coordenada na saída rival. Mantém intensidade alta fazendo isso, até pelo calendário mais tranquilo que possui em 2020. Sobe com pelo menos seis jogadores com alvos pré-definidos, utiliza esses encaixes para pressionar, e costuma ter bons resultados.

O problema vem quando o adversário supera esse primeiro momento. Há uma imensa dificuldade em reagrupar os setores e proteger o ”fundo” do campo. A última linha de defesa não tem mostrado uma coordenação eficaz. Erra bastante. E o Flamengo pode se aproveitar disso. Assim como o Galo pode se beneficiar das vezes em que o rubro-negro ”sobe” a marcação, mas não o faz com intensidade.

Ao contrário de Sampaoli, Domènec gosta que seus jogadores se adiantem marcando por zona, sem encaixes pré-determinados, mas falta pegada para pressionar a bola muitas vezes. O excesso de jogos pode influenciar nisso, mas o fato é que os setores acabam se distanciando e os espaços aparecem para os rivais.

Essa ausência de ”pressão na bola” também é uma realidade de Flamengo e Atlético quando o bloco de marcação recua. No Galo há até uma confusão grande de posicionamento. Seguidos espaços entre os integrantes da última linha de defesa e compactação irregular para a linha de meio-campo. O rubro-negro até consegue se compactar nesse momento, mas segue dando espaço a quem tem a bola no pé.

Times no divã

Vencer o jogo deste domingo não dará o título do Brasileirão nem a um nem a outro. Mas conseguir superar os problemas citados acima e potencializar as virtudes dará mais confiança para a sequência na temporada e reduzir a pressão que paira sobre as cabeças de Jorge Sampaoli e Domènec Torrent.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

Fonte: https://www.uol.com.br/esporte/colunas/rodrigo-coutinho/2020/11/08/fique-de-olho-no-que-pode-decidir-atletico-e-flamengo.htm