Astrônomos acreditam ter encontrado o elo perdido dos buracos negros

Thiago Signorini Gonçalves

Thiago Signorini Gonçalves é doutor em astrofísica pelo Instituto de Tecnologia da Califórnia, professor do Observatório do Valongo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e coordenador de comunicação da Sociedade Astronômica Brasileira. Utilizando os maiores telescópios da Terra e do espaço, estuda a formação e evolução de galáxias, desde o Big Bang até os dias atuais. Apaixonado por ciência, tenta levar os encantos do Universo ao público como divulgador científico.

01/04/2021 04h00

começo do mês passado também. Mas esperem! Pois é, temos mais novidades sobre os buracos negros.

Dessa vez, descobriram um buraco negro de massa intermediária, ou seja, aproximadamente 50 mil vezes a massa do Sol. O anúncio vem da Universidade de Melbourne, na Austrália, em artigo publicado na renomada Nature Astronomy e liderado por James Paynter.

A técnica é inovadora. Sabemos que, com certa frequência, conseguimos observar explosões de raios gama no universo, que muitas vezes vêm de objetos a enormes distâncias.

Segundo a teoria da relatividade de Einstein, ao passar próximo a um corpo massivo, a radiação gama dessa explosão poderia ser defletida, curvada. E se o corpo é denso o suficiente, a curvatura é tão forte que um raio passando por lados opostos desse corpo poderiam ser defletidos para o mesmo ponto, como se houvesse uma gigantesca lente naquele ponto. É o chamado efeito de lentes gravitacionais, também bastante conhecido e estudado na astronomia.

O pulo do gato nesse caso é que o caminho percorrido pela radiação pode ser um pouco mais longo por um caminho que pelo outro. Assim, quando o surto de raios gama chega à Terra, após viajar por bilhões de anos, podemos observar na verdade dois pulsos, com um pequeno atraso de 0,4 segundo entre eles.

Fazendo as contas, esse atraso corresponde (provavelmente) a um buraco negro de 55 mil vezes a massa do Sol.

Cachinhos Dourados

Essa massa é o provável elo perdido dos buracos negros. Como na história de Cachinhos Dourados, nem muito grande, nem muito pequena.

Isso é importante porque esse tipo de buraco negro nunca foi observado de forma definitiva. Conhecemos, sim, os buracos negros pequenos, com massas parecidas à do Sol, que se formaram no final da vida de uma estrela particularmente grande e brilhante, após a explosão de uma supernova.

Também conhecemos os buracos negros supermassivos, com massas de milhões ou bilhões de vezes a do nosso Sol, que residem no centro de galáxias. Nossa própria Via Láctea abriga um buraco negro do tipo.

No entanto, ainda não sabemos como esses buracos negros gigantes se formaram. Podem ter sido a partir de buracos negros menores, pode ser uma região com matéria escura que atraiu uma enorme quantidade de gás no começo do universo que colapsou e formou o buraco negro gigante de uma só vez.

Seja como for, se o resultado for confirmado, é uma excelente oportunidade para quem trabalha nessa área. Como a descoberta de um fóssil de um ancestral humano, a observação detalhada desse objeto permitiria o estudo e investigação dos estágios iniciais de buracos negros supermassivos, antes que se tornem, bem, supermassivos.

Eu diria que ainda não podemos ter certeza de que seja o caso. Mas a ciência funciona assim: uma boa descoberta abre as portas para dezenas de outros estudos e pesquisas.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Fonte: https://www.uol.com.br/tilt/colunas/thiago-goncalves/2021/04/01/astronomos-encontram-buraco-negro-dos-cachinhos-dourados.htm