A corrida dos investidores para a Bolsa: estamos criando uma nova bolha?

Fernando Damasceno

Especialista em fundos na área de research do banco digital modalmais. Possui mais de 15 anos de experiência no mercado financeiro. Iniciou sua carreira na consultoria de riscos Riskoffice. Foi riskmanager e gestor de fundo quantitativo da Mapfre investimentos. Foi gestor de riscos em gestoras renomadas do mercado financeiro e é atuário pela Pontifícia universidade Católica (PUC)

01/03/2021 04h00

Vivenciamos em 2020 um dos anos mais voláteis da história, seguido do trimestre de maior valorização da história, ao menos para o mercado financeiro. As razões para tal são diversas, e a discussão a esse respeito bem longa.

A necessidade de aceleração de instrumentos tecnológicos para suprir a impossibilidade da maior parte das pessoas do mundo todo não poder sair de casa gerou a necessidade de atitudes drásticas pelos bancos centrais e dos governos mundo afora.

Enquanto a economia real patina, desemprego e dificuldades dentro de um ambiente extremamente restritivo na vida das pessoas prejudicam a maior parte dos pequenos e médios negócios.

Toda essa movimentação vem a cada dia levantando mais questionamentos em relação a uma possível sobrevalorização dos ativos, a clássica bolha, especialmente nas empresas de tecnologia.

A busca de investidores por empresas da Bolsa de Valores, aliado a um cenário de juros muito baixos, com bancos centrais ao redor do mundo imprimindo dinheiro num ritmo jamais visto, traz um apetite ao risco enorme, levando preços de ativos de empresas que prometem ser ou se tornar tecnológicas a patamares estratosféricos.

E a pergunta que fica: esse cenário faz sentido? Uma nova bolha está sendo criada?

Certamente nem todas as empresas conseguirão realizar tal feito. Certamente nem todas os lojistas online presentes no Brasil se tornarão a Amazon brasileira, a despeito do que os preços atuais possam dizer. Assim como, muito provavelmente, nem todos os grandes bancos do país sofrerão golpes permanentes por parte das fintechs.

Ainda precisamos colocar uma eventual, mesmo que improvável, mudança do cenário macroeconômico. Será que essa festa de juros baixos e estímulos vai durar tanto tempo a ponto de empresas disruptivas conseguirem rentabilizar o capital investido? E o que acontece se as taxas de juros voltarem a subir?

Vimos no início do ano o Banco Central brasileiro anunciar o fim do “Foward Guidance” e deixar aberto um possível novo ciclo de aumento da taxa de juros Selic —o que para muitos do mercado financeiro foi visto com bons olhos devido à aceleração recente dos indicadores de inflação e à necessidade de uma ação mais rápida do que o esperado do Banco Central.

Porém, as expectativas dos analistas do mercado financeiro são de um certo otimismo com a retomada gradual da economia, aliado à chegada de vacinas. Existe uma demanda reprimida pela vacina e isso pode fazer de 2021 um ano de crescimento do PIB acima do esperado, com inflação ficando perto do teto da meta estipulado pelo Banco Central.

Além disso, o ciclo virtuoso dos preços das commodities mundo afora pode fazer de 2021 um ano excelente para a Bolsa brasileira.

Como entrave desse possível processo de valorização dos ativos de riscos brasileiros, temos os desafios de equalizar as contas públicas, aprovando reformas, possíveis privatizações e PECs (Propostas de Emenda Constitucional), o que aceleraria um processo de crescimento econômico e demonstraria para os investidores estrangeiros que o Brasil, apesar das dificuldades, segue como uma boa aposta e pode retomar o processo de desenvolvimento e crescimento econômico.

Dito isso, é impossível trazer uma resposta precisa, mas me parece extremamente impreciso acreditar que teremos tantas empresas vencedoras como os mercados vêm precificando, portanto, narrativas podem trazer somente meias verdades.

Seguindo esta linha de raciocínio, é de extrema importância buscar o máximo de informações sobre os ativos e as empresas em que se queira investir, avaliando sempre os resultados dos balanços, análises setoriais e o desempenho da economia como um todo.

Cuidado e razão são extremamente necessários ao julgarmos em quais narrativas podemos arriscar. A volatilidade dos mercados faz parte do jogo, e os números precisam corroborar as teses ao longo do tempo.

Este material é exclusivamente informativo, e não recomendação de investimento. Aplicações de risco estão sujeitas a perdas. Rentabilidade do passado não garante rentabilidade futura.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Fonte: https://economia.uol.com.br/mais/colunas/2021/03/01/sobrevalorizacao-ativos-bolha-investimentos-volatilidade.htm